sábado, 25 de outubro de 2008

Texto de Frei Betto

Peço Desculpas
Frei Betto - Adital
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Estou gravemente enfermo. Gostaria de manifestar publicamente minhas escusas a todos que confiaram cegamente em mim. Acreditaram em meu suposto poder de multiplicar fortunas. Depositaram em minhas mãos o fruto de anos de trabalho, de economias familiares, o capital de seus empreendimentos.

Peço desculpas a quem assiste às suas economias evaporarem pelas chaminés virtuais das Bolsas de Valores, bem como àqueles que se encontram asfixiados pela inadimplência, os juros altos, a escassez de crédito, a proximidade da recessão.

Sei que nas últimas décadas extrapolei meus próprios limites. Arvorei-me em rei Midas, criei em torno de mim uma legião de devotos, como se eu tivesse poderes divinos. Meus apóstolos - os economistas neoliberais - saíram pelo mundo a apregoar que a saúde financeira dos países estaria tanto melhor quanto mais eles se ajoelhassem a meus pés.

Fiz governos e opinião pública acreditarem que o meu êxito seria proporcional à minha liberdade. Desatei-me das amarras da produção e do Estado, das leis e da moralidade. Reduzi todos os valores ao cassino global das Bolsas, transformei o crédito em produto de consumo, convenci parcela significativa da humanidade de que eu seria capaz de operar o milagre de fazer brotar dinheiro do próprio dinheiro, sem o lastro de bens e serviços.

Abracei a fé de que, frente às turbulências, eu seria capaz de me auto-regular, como ocorria à natureza antes de ter seu equilíbrio afetado pela ação predatória da chamada civilização. Tornei-me onipotente, supus-me onisciente, impus-me ao planeta como onipresente. Globalizei-me.

Passei a jamais fechar os olhos. Se a Bolsa de Tóquio silenciava à noite, lá estava eu eufórico na de São Paulo; se a de Nova York encerrava em baixa, eu me recompensava com a alta de Londres. Meu pregão em Wall Street fez de sua abertura uma liturgia televisionada para todo o orbe terrestre. Transformei-me na cornucópia de cuja boca muitos acreditavam que haveria sempre de jorrar riqueza fácil, imediata, abundante.

Peço desculpas por ter enganado a tantos em tão pouco tempo; em especial aos economistas que muito se esforçaram para tentar imunizar-me das influências do Estado. Sei que, agora, suas teorias derretem como suas ações, e o estado de depressão em que vivem se compara ao dos bancos e das grandes empresas.

Peço desculpas por induzir multidões a acolher, como santificadas, as palavras de meu sumo pontífice Alan Greenspan, que ocupou a sé financeira durante dezenove anos. Admito ter ele incorrido no pecado mortal de manter os juros baixos, inferiores ao índice da inflação, por longo período. Assim, estimulou milhões de usamericanos à busca de realizarem o sonho da casa própria. Obtiveram créditos, compraram imóveis e, devido ao aumento da demanda, elevei os preços e pressionei a inflação. Para contê-la, o governo subiu os juros... e a inadimplência se multiplicou como uma peste, minando a suposta solidez do sistema bancário.

Sofri um colapso. Os paradigmas que me sustentavam foram engolidos pela imprevisibilidade do buraco negro da falta de crédito. A fonte secou. Com as sandálias da humildade nos pés, rogo ao Estado que me proteja de uma morte vergonhosa. Não posso suportar a idéia de que eu, e não uma revolução de esquerda, sou o único responsável pela progressiva estatização do sistema financeiro. Não posso imaginar-me tutelado pelos governos, como nos países socialistas. Logo agora que os Bancos Centrais, uma instituição pública, ganhavam autonomia em relação aos governos que os criaram e tomavam assento na ceia de meus cardeais, o que vejo? Desmorona toda a cantilena de que fora de mim não há salvação.

Peço desculpas antecipadas pela quebradeira que se desencadeará neste mundo globalizado. Adeus ao crédito consignado! Os juros subirão na proporção da insegurança generalizada. Fechadas as torneiras do crédito, o consumidor se armará de cautelas e as empresas padecerão a sede de capital; obrigadas a reduzir a produção, farão o mesmo com o número de trabalhadores. Países exportadores, como o Brasil, verão menos clientes do outro lado do balcão; portanto, trarão menos dinheiro para dentro de seu caixa e precisarão repensar suas políticas econômicas.

Peço desculpas aos contribuintes dos países ricos que vêem seus impostos servirem de bóia de salvamento de bancos e financeiras, fortuna que deveria ser aplicada em direitos sociais, preservação ambiental e cultura.

Eu, o mercado, peço desculpas por haver cometido tantos pecados e, agora, transferir a vocês o ônus da penitência. Sei que sou cínico, perverso, ganancioso. Só me resta suplicar para que o Estado tenha piedade de mim.

Não ouso pedir perdão a Deus, cujo lugar almejei ocupar. Suponho que, a esta hora, Ele me olha lá de cima com aquele mesmo sorriso irônico com que presenciou a derrocada da torre de Babel.

[Autor de "Cartas da Prisão" (Agir), entre outros livros].


* Escritor e assessor de movimentos sociais

Fonte: ADITAL

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

VII Expo Brasil Desenvolvimento Local acontecerá em Cuiabá/MT

Cuiabá (MT) sediará, entre os dias 12 e 14 de novembro, a VII Expo Brasil Desenvolvimento Local, palco do mais expressivo debate e da maior troca, no contexto nacional e internacional, de experiências de desenvolvimento local como estratégia de inclusão e transformação social. Cerca de sete mil pessoas de todo o Brasil e do exterior participarão da sétima edição do evento, que este ano contará com a presença de outros 13 países (Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Cuba, Costa Rica, Cabo Verde, Estados Unidos, Nicarágua, Peru, Paraguai, Portugal e Uruguai).

O fortalecimento de dinâmicas de rede, no sentido visceral (redes distribuídas), constitui uma ênfase da Expo Brasil 2008, mais do que um tema ou dimensão. A Expo 2008, não só como evento mas como processo, será um ambiente estimulador de conexões entre os mais diferentes agentes motivados com o desenvolvimento sustentável em bases territoriais. É este fluxo de inteligência coletiva que fará a diferença da Expo Brasil Desenvolvimento Local 2008.

Confira a programação AQUI


Maiores detalhes nos sites:

brasillocal.blogspot.com
www.expobrasil.org.br

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Etnodesenvolvimento no Blog Nacional

Estratégias para o etnodesenvolvimento

Graduado em jornalismo, Quêner Chaves dos Santos desde cedo voltou-se para a militância política – focada principalmente na economia solidária. Trabalhou no apoio à organização produtiva de comunidades quilombolas no Governo Olívio Dutra, em 2002 e, no ano seguinte, no Departamento de Economia Solidária da prefeitura de Alvorada (RS). Atualmente, exerce o cargo de assessor de Etnodesenvolvimento do Projeto Brasil Local. Nesta entrevista ele explica o conceito de etnodesenvolvimento, fala sobre a participação dos povos tradicionais na construção de políticas públicas e aponta alternativas para impulsionar o desenvolvimento nos territórios onde estas populações vivem.

O que é etnodesenvolvimento?

O etnodesenvolvimento começou a ser trabalhado no início da década de 80, como parte de um movimento voltado para mudar os padrões do modelo de desenvolvimento que vinha sendo implementado, com altos impactos ambientais e desrespeito aos povos de comunidades tradicionais. O conceito de etnodesenvolvimento foi formulado pelo antropólogo mexicano Rodolfo Stavenhagem e apresentado em uma reunião promovida pela Unesco em 1981 e diz respeito à autonomia e participação dos povos tradicionais na construção de políticas públicas voltadas para eles mesmos. Então, a partir daquele momento, começou-se a discutir uma nova proposta de desenvolvimento, com respeito a estas populações e a natureza como um todo.


Mas que comunidades entram nesse conceito de etnodesenvolvimento?

É um conceito que começa com uma vertente mais indígena, a partir da luta dos povos na América Latina e do reconhecimento dessa luta pela Organização das Nações Unidaas e pela Organização Internacional do Trabalho. Mas, no último período, este conceito está sendo ampliado para a perspectiva de povos tradicionais. O Brasil mesmo aprovou recentemente uma legislação sobre o desenvolvimento de populações tradicionais, que são um conjunto de povos que tem na sua relação com a terra a força motriz para o seu processo de produção cultural e econômica. Se encaixam aí as comunidades quilombolas, indígenas, ribeirinhos, ciganos e etc. Atualmente, já contabilizamos mais de 20 segmentos no âmbito dos povos tradicioanis.Então, o objetivo é pensar o desenvolvimento a partir da relação que estas populações têm com a terra e suas relações culturais e religiosas. Stavenhagem define este conceito como uma perspectiva de desenvolvimento que respeita as populações tradicionais. Ou seja, não deve ser um modelo imposto, mas sim construído de forma coletiva.

Qual a relação entre o etnodesenvolvimento e a economia solidária?

As formas de produção destas populações se identificam muito com os princípios da economia solidária. São práticas de autogestão e auto-organização dos trabalhadores. Ou seja, os meios de produção estão nas mãos de quem produz. Esta relação de solidariedade, de pensar um bem estar social acima de tudo, em vez de supervalorizar o poder econômico, são práticas muito características destas populações. Povos indígens e quilombolas, por exemplo, sempre tiveram sua forma de organização não na perspectiva do enriquecimento e do lucro, mas na partilha, na troca, na relação de confiança. Isso tem muito a ver com a economia solidária. É por isso que hoje em dia existe esta relação mais orgânica entre os povos e tradicionais e o modelo de desenvolvimento proposto pela economia solidária. A economia solidária agrega um conjunto de ações e instrumentos que fortalecem essas práticas.

Atualmente, o governo federal tem políticas voltadas à oferta de crédito para estas comunidades, de apoio aos bancos comunitários, à incubação de empreendimentos, entre outras. Por outro lado, estas populações contribuem do ponto de vista do respeito à natureza e dos fortes laços de solidariedade que mantêm entrem elas, o que acaba refletindo na economia solidária. Tanto que a I Conferência Nacional de Economia Solidária, realizada em 2006, apontou como um dos eixos estratégicos o fortalecimentos destas comunidades, particularmente nos que diz respeito a titulação das áreas onde estas populações vivem como uma luta também da ecosol. Recentemente, a IV Plenária Nacional de Economia Solidária também apontou para a solidariedade com estas populações. Além disso, as comunidades tem assento no Conselho Nacional de Economia Solidária. Já existe uma relação forte entre os dois movimentos.

E qual é o papel do Brasil Local?

A ação do Brasil Local começa pela própria forma como o Projeto se estrutura, a partir da atuação de agentes de Desenvolvimento inseridos nas próprias comunidades beneficiárias. Isso acaba fortalecendo estas comunidades. Nós temos 65 agentes quilombolas e 15 indígenas. São pessoas que nos ajudam a pensar e promover o etnodesenvolvimento e o desenvolvimento local a partir da realidade dos territórios. Eles realizam diagnósticos, mobilizam a comunidade e constrõem parcerias. Na verdade, o Brasil local cumpre o papel de levar um conjunto de políticas públicas da Secretaria Nacional de Economia Solidária (Senaes) e outros orgãos até estas comunidades. O Projeto vem demonstrando resultados positivos.

É bom lembrar que o próprio Brasil Local nasceu de um Projeto voltado para a promoção do etnodesenvolvimento num diálogo iniciado em 2004 entre a Senaes, a Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir) e a Fundação Palmares, do Ministério da Cultura. Nesta etapa, foram mapeadas 216 comunidades. Era uma realidade que não se conhecia. Sabia-se mais ou menos o número de comunidades, mas não se tinha uma radiografia de como viviam estas comunidades. Então, os agentes, com seu trabalho, identificaram uma série de problemas de infra-estrutura, de comercialização, de falta de tecnologia para os empreendimentos mas também um conjunto de potencialidades que estas comunidades tinham para se desenvolver. O Brasil Local tem este mérito de trazer à tona a realidade destas populações.


Vejam o material na integra no Blog Nacional do Brasil Local

Assessoria de Comunicação
Fernanda Barreto
(61) 9965.1219

fernanda.ascom@brasilocal.org.br

sábado, 4 de outubro de 2008

Autonomia econômica das mulheres é tema para reflexão

A Economia Solidária tem se manifestado como uma alternativa ao modo de organização capitalista.

Discute-se, entretanto, que para sua construção novas relações de gênero sejam definidas.

Ao longo dos anos, a inserção das mulheres no mercado de trabalho ocorreu de forma desigual, principalmente se analisarmos a segregação dentro da lógica capitalista vigente, onde ocupam os espaços mais precarizados de emprego e com menores salários em relação ao sexo oposto.

Essa temática tem despertado um enorme interesse entre as feministas de vários lugares do país. Debates, pesquisas e uma série de outras iniciativas surgiram para contribuir com a luta.

Sugerimos o texto a seguir:

ECONOMIA SOLIDÁRIA E FEMINISTA: REFLEXÕES EM TORNO DA AUTONOMIA ECONÔMICA DAS MULHERES

Elaborado por: Cleudes Pessoa, Jeannette Filomeno Pouchain Ramos e Socorro Letícia Fernandes Peixoto.

Boa leitura a tod@s!!!

Fonte: FBES